O confronto entre o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e o presidente do Federal Reserve (Fed), Jerome Powell, tem movimentado os mercados financeiros e levantado debates sobre a independência do banco central americano. Trump, conhecido por sua abordagem direta, tem criticado duramente Powell, chamando-o de “burro” e “teimoso” por manter as taxas de juros na faixa de 4,25% a 4,50% ao ano, sem sinalizar cortes imediatos. Para o presidente, os juros deveriam estar “dois a três pontos abaixo”, uma pressão que reflete sua visão de impulsionar a economia com dinheiro mais acessível.
O Contexto da Disputa
A disputa ganhou destaque após a decisão do Fed, na semana passada, de manter os juros inalterados pela quarta vez consecutiva, mesmo sob forte pressão de Trump. Desde que assumiu seu segundo mandato, em 20 de janeiro de 2025, o presidente intensificou sua agenda econômica, com foco em tarifas comerciais elevadas. Essas medidas, embora visem proteger a indústria nacional, geram preocupações sobre aumento da inflação, o que torna o Fed cauteloso em reduzir os juros.
Powell, por outro lado, adota uma postura técnica. Em recente depoimento ao Congresso, ele destacou que o Fed não tem pressa para cortar juros, especialmente porque espera um possível aumento da inflação nos próximos meses, impulsionado pelas tarifas de Trump e por tensões no Oriente Médio. “Devemos começar a ver isso [o impacto inflacionário] durante o verão, nos números de junho e julho”, afirmou Powell, reforçando que a política monetária deve se guiar por dados, não por pressões políticas.
A Pressão por Mudanças no Fed
Além das críticas públicas, Trump tem cogitado acelerar a sucessão de Powell, cujo mandato como presidente do Fed termina em maio de 2026. Segundo o Wall Street Journal, o presidente considera anunciar um substituto já em setembro ou outubro de 2025, quebrando a tradição de transições mais próximas do fim do mandato. Essa possibilidade aumentou as especulações nos mercados, com alguns analistas apostando em um corte de juros antecipado, possivelmente já em julho, caso membros do Fed alinhados a Trump, como Michelle Bowman e Christopher Waller, ganhem influência.
Bowman, vice-presidente de Supervisão do Fed, já defendeu publicamente uma redução de juros em julho, minimizando os impactos inflacionários das tarifas e das tensões geopolíticas. Waller, outro indicado por Trump, também sugeriu que as tarifas podem causar apenas um aumento pontual nos preços, sem efeitos duradouros. Essas posições contrastam com a cautela de Powell, que insiste em esperar dados mais claros sobre inflação e mercado de trabalho antes de agir.
Impactos nos Mercados e na Economia
A incerteza gerada por esse embate tem reflexos diretos nos mercados. Os índices operam com cautela, enquanto investidores aguardam as próximas movimentações do Fed e a divulgação de novos dados econômicos.
A guerra comercial de Trump, com tarifas que atingem mais de 180 países, também alimenta temores de inflação e possível desaceleração econômica. Apesar de um acordo temporário com a China ter reduzido algumas taxas por 90 dias, a retomada das alíquotas no chamado “Dia da Libertação” em julho mantém os agentes financeiros em alerta. Economistas alertam que, se as pressões inflacionárias se confirmarem, o Fed pode ser forçado a manter os juros altos, contrariando ainda mais as expectativas de Trump.
A Independência do Fed
O embate também reacende discussões sobre a autonomia do Federal Reserve. A Gavekal, em relatório recente, apontou uma “dose incomum” de influência política no Fed, sugerindo que alguns membros, como Bowman e Waller, podem estar se posicionando para suceder Powell. No entanto, a estrutura do Fed, com 12 membros votantes e nomeações regionais fora do controle direto do presidente, limita a capacidade de Trump de alterar radicalmente a política monetária.
Powell, por sua vez, mantém o discurso de independência, enfatizando que o Fed não comenta políticas comerciais, mas foca em controlar a inflação. “Nosso trabalho é manter a inflação sob controle e, quando as políticas têm implicações significativas de curto e médio prazo, então a inflação passa a ser nosso trabalho.”, declarou.
O que está em jogo nessa disputa?
A disputa entre Trump e Powell vai além de uma queda de braço pessoal. Ela reflete um choque entre a visão de curto prazo do presidente, que busca crescimento econômico rápido, e a abordagem de longo prazo do Fed, preocupada com estabilidade e inflação. Com o mercado de trabalho ainda forte e incertezas globais, como os conflitos no Oriente Médio e a guerra comercial, o Fed enfrenta um cenário complexo. Enquanto Trump pressiona por juros mais baixos, Powell insiste em esperar dados concretos, mantendo a cautela que tem marcado sua gestão.
Os próximos meses, especialmente com a divulgação dos dados de inflação de junho e julho, serão cruciais para definir o rumo dessa batalha. Por enquanto, os mercados seguem atentos, e a independência do Fed permanece no centro do debate.


